O Deus que desconstrói

Daniel Lima

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Não tem jeito! Nosso coração é idólatra! Se, como eu, você já ficou surpreso com a rapidez com que o povo de Israel nos relatos bíblicos abandona a Deus e se volta para os ídolos pagãos, você sabe do que estou falando. Os israelitas foram surpreendidos pelo poder de Deus, milagres após milagres foram evidenciados. Por fim, fugindo de um exército focado no extermínio, eles presenciam a abertura do mar Vermelho e a consequente destruição desse exército. Apesar disso, após apenas 45 dias, diante da escassez de comida, o povo declara: “Quem nos dera tivéssemos morrido pela mão do Senhor na terra do Egito, quando estávamos sentados junto às panelas de carne e comíamos pão à vontade! Pois vocês nos trouxeram a este deserto a fim de matarem de fome toda esta multidão” (Êxodo 16.3). A resposta de Deus foi mais um milagre, dessa vez por meio de codornizes. Algum tempo depois, com a aparente demora de Moisés em descer do monte Sinai, eles não só reclamam, mas passam a cultuar um ídolo!

Esse padrão se repete, com extrema facilidade – os israelitas se voltam de Deus para ídolos falsos. No entanto, não seja muito rápido em condená-los. Percebo em minha vida uma tendência muito semelhante. Com frequência, tenho períodos de intimidade com Deus, tempos em que minha oração é espontânea e sincera. São períodos em que minhas emoções acompanham minha fé, ameaças não me abalam e eventos contrários não me roubam a alegria. Na verdade, nesses momentos sou usado por ele para animar outros, para encorajar os abatidos, para animar os fracos.

“Porque o meu povo cometeu dois males: abandonaram a mim, a fonte de água viva, e cavaram cisternas, cisternas rachadas, que não retêm as águas.” (Jr 2.13)

A dura realidade é que, com frequência, de modo sutil, meu coração começa a “se abastecer” de outras fontes. Não são, em geral, coisas pecaminosas. Às vezes um ministério que apresenta bons resultados me encanta, uma benção de Deus alivia problemas, uma palavra de encorajamento anima meu espírito. E, de repente, eu começo a confiar nessas coisas e não no Deus que as provê. Minha alegria e meu ânimo começam a depender de resultados, de benção e de palavras de encorajamento. Em resumo, essas coisas se tornam “meu salvador”, aquilo que parece me trazer vida. 

Esse processo é descrito pelo Senhor em Jeremias 2.13 assim: “Porque o meu povo cometeu dois males: abandonaram a mim, a fonte de água viva, e cavaram cisternas, cisternas rachadas, que não retêm as águas”. Reparem que são dois atos simultâneos e pecaminosos. O primeiro ato é abandonar a fonte de água viva. Esse é o primeiro movimento, o que está no fundo de nosso coração rebelde, um anseio por autonomia, especialmente diante de Deus. No fundo, não queremos continuar dependendo dele, queremos “garantir” o que desejamos. E o segundo ato é cavar para si cisternas rachadas, que não podem nem produzir nem reter água. São apenas tentativas humanas de tentar reter as bençãos de Deus, como se assim pudéssemos não depender tanto dele. 

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Nesses momentos, Deus, como pai amoroso, precisa me libertar desse cativeiro que está ganhando terreno em minha alma. E, repentinamente, ele me priva de resultados, de benção e de palavras de encorajamento. Minha primeira reação à abstinência é revolta ou às vezes ativismo. Trabalho mais pelos resultados, busco mais bençãos, aguardo mais ansioso por palavras. Mas nosso Deus é bondoso e firme. Ele mantém o período de seca até que minha alma se volte para a única fonte de vida: ele mesmo!

O salmo 42 expressa o fruto desse período de “desconstrução” que Deus opera misericordiosamente em minha vida. Observe os versículos 1 e 2:

Assim como a corça suspira pelas correntes das águas, assim, por ti, ó Deus, suspira a minha alma. A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo. Quando irei e me apresentarei diante da face de Deus?

Quando Deus retira esses falsos deuses de minha vida, eu percebo que tenho sede, mas não de resultados, bençãos ou palavras humanas. Tenho sede de Deus!

Quando Deus retira esses falsos deuses de minha vida, eu percebo que tenho sede, mas não de resultados, bençãos ou palavras humanas. Tenho sede de Deus! Assim como o salmista, eu anseio por voltar à fonte de água viva, àquele que conquistou meu coração e que é o único que pode satisfazer minha alma. No verso 5 do mesmo salmo, o autor responde à sua própria alma: “Por que você está abatida, ó minha alma? Por que se perturba dentro de mim? Espere em Deus, pois ainda o louvarei, a ele, meu auxílio e Deus meu”.

Por isso eu agradeço a Deus por esses períodos de “desconstrução”, períodos em que Deus frustra meus planos por amor a mim, por saber que meus planos e anseios com frequência me afastam daquele que é a própria vida. Se você, como eu, tem andado com Cristo há algum tempo, já passou por períodos assim. Oro para que Deus continue essas “desconstruções” periódicas em minha vida e também na sua.

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Daniel Lima (D.Min., Fuller Theological Seminary) serviu como pastor em igrejas locais por mais de 25 anos. Também formado em psicologia com mestrado em educação cristã, Daniel foi diretor acadêmico do Seminário Bíblico Palavra da Vida (SBPV) por cinco anos. É autor, preletor e tem exercido um ministério na formação e mentoreamento de pastores. Casado com Ana Paula há mais de 30 anos, tem quatro filhos, dois netos e vive no Rio Grande do Sul desde 1995. Ele estará presente no 25º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.

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