Equilíbrio ou ritmo de vida?
Vivemos em tensão! Somos constantemente desafiados a desempenhar nosso máximo em vários contextos. Devemos ser excelentes maridos, pais exemplares, amigos presentes e ouvintes atentos. Ao mesmo tempo somos chamados a sermos profissionais dedicados, conectados com o mundo profissional, criativos e competentes. E nós, cristãos, também somos chamados a nos envolver na igreja, servir em várias funções, crescer no conhecimento da Bíblia e sermos líderes de grupos, ministérios e de nossos lares. Não é surpresa que o número de burnouts tem crescido, ainda mais neste contexto de pandemia.
Diante disso, toda vez que cristãos se reúnem para comentar sobre suas tentativas frustradas de administrar seu tempo diante de múltiplas demandas, o termo mais usado é equilíbrio. Minha pergunta é se equilíbrio é a melhor resposta. Primeiro porque não há um verso que nos chame a viver uma vida equilibrada. Jesus não afirma que devemos equilibrar entre segui-lo e seguir o mundo. Seu convite é radical. Homens como Paulo não viveram vidas equilibradas entre trabalho e ministério.
Estou convencido de que devemos buscar ritmo e não equilíbrio na vida. Equilíbrio não é o mesmo que ritmo. Na verdade, ritmo é quase o contrário de equilíbrio. Enquanto equilíbrio indica uma posição na qual duas ou mais forças se anulam mutuamente, ritmo se refere a uma sucessão de períodos regulares em que forças se acentuam de modo alternado. Equilíbrio é estático, ritmo é movimento. Seja nas estações, seja nas batidas de seu coração, seja nas etapas da vida, seja no nascer e pôr do sol, a vida é vivida em termos de ritmo. Salomão, tido como o homem mais sábio do mundo, declara em Eclesiastes 3.1-8:
“Para tudo há uma ocasião certa; há um tempo certo para cada propósito debaixo do céu:
Tempo de nascer e tempo de morrer,
tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou,
tempo de matar e tempo de curar,
tempo de derrubar e tempo de construir,
tempo de chorar e tempo de rir,
tempo de prantear e tempo de dançar,
tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntá-las,
tempo de abraçar e tempo de se conter,
tempo de procurar e tempo de desistir,
tempo de guardar e tempo de jogar fora,
tempo de rasgar e tempo de costurar,
tempo de calar e tempo de falar,
tempo de amar e tempo de odiar,
tempo de lutar e tempo de viver em paz.”
Vemos o mesmo nos ciclos de vida na experiência humana. Uma criança pequena vive em uma sucessão de períodos de brincar, comer, dormir, interagir. No momento em que cresce, alguns destes períodos começam a ficar mais rígidos. O solteiro vive em um ritmo e somente um tolo acredita que o ritmo de vida de um casado é o mesmo do solteiro. Um casal sem filhos vive uma rotina; uma vez nascido um filho, eles se perguntam o que faziam com todo o tempo que tinham antes daquela criança nascer. Enfim, vivemos períodos diferentes em termos físicos, emocionais, psicológicos e relacionais. Paulo nos indica essa realidade ao escrever em 1Coríntios 13.11: “Quando eu era menino, falava como menino, pensava como menino e raciocinava como menino. Quando me tornei homem, deixei para trás as coisas de menino”.
O Novo Testamento grego usa pelo menos duas palavras para “tempo”. Uma é cronos e a outra é kairós. A primeira trata do tempo corrido, marcado por horas, dias, meses e anos; cronos é representado por relógios e calendários. A segunda é o tempo oportuno, o momento, a ocasião; trata-se de circunstâncias significativas e deve ser medido mais por seu impacto do que por sua duração.
Na passagem acima, Salomão não se refere a horas ou dias, mas a momentos que exigem de nós reações diferentes. Há tempo para chorar. Quanto tempo devemos chorar? O tempo acima é do tipo kairós – oportunidade. Paulo escreve a respeito desse tempo em Efésios 5.15-16:
“Tenham cuidado com a maneira como vocês vivem; que não seja como insensatos, mas como sábios, aproveitando ao máximo cada oportunidade, porque os dias são maus.”
A palavra “oportunidade” no texto é exatamente kairós. Somos chamados a nos dedicar às oportunidades conforme elas surgem. Ao mesmo tempo, não somos chamados a tentar fazer tudo ou ocupar todo o nosso tempo sem descanso. Na verdade, muito de nossa obsessão com trabalho ou ministério vem de nossa crença distorcida de que tudo depende de nós. Quando Deus instituiu o descanso sabático, seu foco era não sacralizar um dia em detrimento dos outros, mas instituir um ritual em que nós, humanos, paramos e, confiando na provisão de Deus, nos dedicamos a ele, gozando das benções que ele nos concedeu.
No próximo artigo gostaria de continuar a explorar este tema sobre ritmo de vida. Creio que, se, ao invés de tentar preencher todos os momentos da nossa vida, nós encontrarmos um ritmo de trabalho, relacionamentos, descanso e lazer, nossa vida estará em uma sintonia mais profunda com nosso Criador e viveremos de um modo que expressará mais profundamente nossa confiança no cuidado de Deus sobre seus filhos.