(Des)conhecendo as motivações

Daniel Lima

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Um dos aspectos mais perversos de um conflito é o quanto nossa mente “preenche as lacunas”. Preencher lacunas, neste caso, significa completar informações que não temos nem podemos ter, mas que imaginamos e das quais estamos convictos. Uma dessas práticas é determinar o que motivou alguém a fazer algo. Com certeza pessoas com discernimento podem intuir qual foi a motivação de outro. No entanto, este intuir deve ser sempre tomado com muito cuidado, com muita humildade.

O processo funciona assim: alguém tem uma atitude ou comportamento que me choca ou ofende. Inicialmente não conseguimos entender o que motivou aquela atitude ou comportamento. No entanto, nossa mente não gosta de lacunas, portanto preenchemos elas “adivinhando” qual foi a motivação, as razões do outro. A partir daí reagimos conforme aquilo que imaginamos que foi a motivação. Quando o outro, por sua vez, responde à nossa reação, com frequência confirmamos nossas impressões. O mais curioso, ou triste, é que como não temos todas as informações, normalmente completamos o que falta com nossas próprias motivações. Isso é chamado de “projeção”. Assim, por exemplo, alguém que luta com inveja vai atribuir a outros esta motivação para seus comportamentos e atitudes.

Com frequência não entendemos com clareza nem nossas próprias reações, quem dirá entender o que motivou outra pessoa.

Há pelo dois aspectos perversos em adivinhar motivações: (1) arrogância e (2) processo concluído. Arrogância, pois mesmo que eu não perceba, estou julgando o que está por trás da atitude de outra pessoa. No fundo, estou afirmando que eu sei o que motivou ou levou o outro a este comportamento, mesmo que a pessoa negue. Conhecendo como somos complexos em nosso modo de pensar, agir e reagir, fica evidente que essa atitude é arrogante. Com frequência não entendemos com clareza nem nossas próprias reações, quem dirá entender o que motivou outra pessoa.

Processo concluído é ainda mais perverso, pois ocorre sem que eu perceba. Processo concluído se refere à prática de que raramente vamos conferir se a motivação do outro foi realmente aquilo que imaginamos. Nosso pensamento, mesmo sem ser consciente, é que “se eu já sei, por que perguntar?”. Por outro lado, mesmo quando vamos investigar, nossa predisposição é contaminada pelo nosso “preencher de lacunas”. Assim reagimos, nos ofendemos, nos decepcionamos com atitudes e motivações que – com frequência – nem são reais.

O que a Bíblia diz sobre esta prática tão comum? Paulo nos instrui em 1Coríntios 2.10-11:

... O Espírito sonda todas as coisas, até mesmo as coisas mais profundas de Deus. Pois quem conhece os pensamentos do homem, a não ser o espírito do homem que nele está? Da mesma forma, ninguém conhece os pensamentos de Deus, a não ser o Espírito de Deus.

Repare no início do verso 11: “... quem conhece os pensamentos do homem, a não ser o espírito do homem que nele está?”. Sim, podemos ter impressões; muitas delas estarão certas, mas muitas serão apenas ecos de nossa própria mente e coração.

Paulo volta a nos instruir sobre este tema em 1Coríntios 4.5:

Portanto, não julguem nada antes da hora devida; esperem até que o Senhor venha. Ele trará à luz o que está oculto nas trevas e manifestará as intenções dos corações. Nessa ocasião, cada um receberá de Deus a sua aprovação.

Reparem que Paulo afirma que “o Senhor trará à luz... as intenções dos corações”. É muito difícil conhecer corretamente o coração de outra pessoa. Com frequência há dores e temores que desconhecemos. Há razões que estão além de nossa observação. Com isso não estou dizendo que pessoas não agem com motivações pecaminosas. Muitas vezes o fazem! No entanto, precisamos tomar muito cuidado para não nos colocarmos numa prisão mental em que chegamos a conclusões que não temos base para tirar.

Deixe-me alistar alguns princípios sobre interpretar motivações dos outros:

  1. Reconheça que há muito que você não sabe e mesmo o que sabe é distorcido ou ofuscado;

  2. Aguarde o momento em que Deus revelará as motivações do coração da outra pessoa. Até lá, cuidado com suas impressões;

  3. Lembre-se de que você foi salvo apesar dos pecados em seu coração, portanto, seja misericordioso com o outro.

Minha oração é que Deus nos conduza a uma postura mais mansa, mais paciente, mais piedosa e bondosa (Gálatas 5.22-23) e menos julgadora uns dos outros. Mesmo Jesus, que realmente conhecia o coração humano, era extremamente compassivo. Que a compaixão, a bondade e o amor sejam nossas marcas.

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Daniel Lima (D.Min., Fuller Theological Seminary) serviu como pastor em igrejas locais por mais de 25 anos. Também formado em psicologia com mestrado em educação cristã, Daniel foi diretor acadêmico do Seminário Bíblico Palavra da Vida (SBPV) por cinco anos. É autor, preletor e tem exercido um ministério na formação e mentoreamento de pastores. Casado com Ana Paula há mais de 30 anos, tem quatro filhos, dois netos e vive no Rio Grande do Sul desde 1995. Ele estará presente no 25º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.

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