A Grande Mentira

Daniel Lima

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A vida parece ser feita em camadas. Conhecemos alguém e a primeira impressão pode nos atrair ou repelir. No entanto, com enorme frequência, ao conhecer melhor a pessoa podemos perceber camadas mais profundas que vão confirmar ou transformar nossa primeira impressão. Assim, alguém com quem não simpatizamos a princípio pode vir a ser nosso amigo mais fiel e íntimo. O mesmo ocorre em quase todas as áreas, por isso primeiras impressões podem ser tão enganosas.

O mesmo ocorre com nossas lutas espirituais. Um vício nunca se limita apenas ao prazer imediato que nos confere o objeto de nossa adicção. Por trás de toda dependência há um grande vazio emocional ou existencial que cada um procura preencher como pode. E por trás desse vazio há crenças e posturas que permitem que ele continue a exercer sua influência em nossa vida. Acerca disso, as palavras de C. S. Lewis são tão esclarecedoras:

Se eu encontro em mim um desejo que nenhuma experiência desse mundo possa satisfazer, a explicação mais provável é que eu fui feito para um outro mundo.[1]

Nesse sentido, uma mentira existe como fundamento de todo conflito humano. Podemos chamá-la de “A Grande Mentira”. Um resumo básico seria: Deus é soberano e bom, mas eu nego isso e tento encontrar meu próprio caminho. Sua primeira versão neste mundo foi aquela apresentada pela serpente no jardim do Éden, mas percebo Paulo falando da mesma estratégia satânica em Romanos 1.18-23. Vamos tentar explicitar o que é essa grande mentira e, desde já, eu desafio cada leitor a examinar seu próprio coração e analisar de que modo essa mentira tem afetado sua caminhada com Jesus.

Os versos 16 e 17 do mesmo capítulo fazem um resumo do próprio evangelho. O verso 18 começa com a palavra “portanto”, ou seja, vai descrever a base do próprio evangelho:

Portanto, a ira de Deus é revelada dos céus contra toda impiedade e injustiça dos homens que suprimem a verdade pela injustiça.

O evangelho se faz necessário, pois a ira de Deus não só existe, mas é demonstrada, apresentada contra toda impiedade e injustiça. Vivemos numa época em que ira é algo sempre negativo ou errado. Assim, hoje muitos cristãos negam ou rejeitam a ideia de que Deus pode se irar. No entanto, a Bíblia contém inúmeras referências à ira de Deus. Podemos ter certeza de que é uma ira santa e justa e não meramente uma explosão de raiva. E a ira de Deus se manifesta contra duas grandes áreas: impiedade (rebelião contra Deus) e injustiça (exploração do próximo). Não deveria nos surpreender que a ira de Deus se manifesta contra o que Jesus ensina como o resumo da lei: amarás a teu Deus e ao teu próximo (ver Mateus 22.36-40).

Paulo explica não só contra o que a ira de Deus se manifesta, mas contra quem: “... homens que suprimem a verdade pela injustiça”. Agora nossa atenção é arrastada para o que esses homens (assim como você e eu) fizeram – em resumo, uma camada mais profunda. Eles não só se rebelaram contra Deus e exploraram o próximo; o fundamento dessas atitudes é que eles suprimiram (esconderam, enterraram, negaram, afogaram) a verdade debaixo da injustiça.

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Adão e Eva aceitaram a mentira de que havia uma plano melhor. Eles enterraram a verdade de Deus – de que foram feitos à imagem deste Deus e de que Deus tinha o bem-estar deles em mente – pela injustiça de que a desobediência era um caminho melhor... Se refletirmos um pouco, todo pecado se resume à mesma atitude. Deus se manifesta, se revela, se apresenta, mas eu sufoco essa verdade por algo que eu acho melhor. Ao continuar seu argumento em Romanos 1.21-23, Paulo apresenta algumas consequências desta atitude:

Porque, tendo conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe renderam graças, mas os seus pensamentos tornaram-se fúteis e coração insensato deles obscureceu-se. Dizendo-se sábios, tornaram-se loucos e trocaram a glória do Deus imortal por imagens feitas segundo a semelhança do homem mortal, bem como de pássaros, quadrúpedes e répteis.

Vamos olhar com um pouco mais de atenção estas consequências:

  1. Seus pensamentos tornaram-se fúteis. Ao negar a verdade, preciso elaborar alguma mentira, alguma distorção para “completar” o quadro. Com isso meus pensamentos ficam comprometidos; por mais cativantes que sejam, são distorcidos e, em última análise, falsos.

  2. Corações insensatos se obscureceram. Coração nos escritos de Paulo é tanto a sede da mente como das emoções e da vontade. Tudo isso fica obscurecido. Não significa que tudo fica errado, mas que todos os aspectos ficam comprometidos, distorcidos. Não podemos perceber a solução devido à escuridão de nossas almas, devido ao fato de que já negamos a verdadeira solução.

  3. Dizendo-se sábios, tornaram-se loucos. Por isso, como insanos, procuramos uma solução onde não existe, pois nos recusamos a reconhecer a verdade.

  4. Passaram a adorar a criação e não o Criador. Fomos feitos para buscar fora de nós as respostas para a vida. Assim, tendo negado a priori a única resposta, precisamos fantasiar, imaginar para nós soluções falsas.

O texto de Paulo descreve a situação de um não convertido. Contudo, reconheço em minha vida e na vida de vários cristãos atitudes que expressam traços dessa grande mentira. São momentos em que eu me recuso a reconhecer a verdade de Deus e “invento” para mim uma outra explicação, que no fundo, no fundo, pela orientação do Espírito Santo, eu sei que não é verdade. Assim, oro, por você e por mim, para que o evangelho tenha seu impacto completo e contínuo em minha vida e na sua e que possamos identificar, nos arrepender e resistir à Grande Mentira.

No próximo artigo quero falar da Grande Verdade!

Nota

  1. C. S. Lewis, Cristianismo Puro e Simples (Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2017), p. 63.
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Daniel Lima (D.Min., Fuller Theological Seminary) serviu como pastor em igrejas locais por mais de 25 anos. Também formado em psicologia com mestrado em educação cristã, Daniel foi diretor acadêmico do Seminário Bíblico Palavra da Vida (SBPV) por cinco anos. É autor, preletor e tem exercido um ministério na formação e mentoreamento de pastores. Casado com Ana Paula há mais de 30 anos, tem quatro filhos, dois netos e vive no Rio Grande do Sul desde 1995. Ele estará presente no 25º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.

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