Os destinatários (Parte 2)

Norbert Lieth

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Depois de examinarmos os versículos 1, 14-15 e 18-19 do primeiro capítulo de 1Pedro no artigo anterior, analisaremos agora mais quatro textos da carta para entender melhor a quem o apóstolo se dirigia.

4. 1Pedro 2.9

“Vocês, porém, são geração eleita, sacerdócio real, nação santa, povo exclusivo de Deus, para anunciar as grandezas daquele que os chamou das trevas para a sua maravilhosa luz” (1Pedro 2.9).

É interessante notar que Paulo, em suas cartas aos cristãos gentios, não emprega a expressão “sacerdócio real”. Embora ele escreva sobre o seu ministério sacerdotal dirigido aos gentios (Romanos 15.16) e de um ministério sacerdotal da fé (Filipenses 2.17), ele não fala de um sacerdócio real como povo santo. Trata-se de uma típica expressão para o chamado de Israel, que Deus determinou como meta para o seu povo: “Vocês serão para mim um reino de sacerdotes e uma nação santa. Essas são as palavras que você dirá aos israelitas” (Êxodo 19.6).

Isaías anuncia profeticamente: “Mas vocês serão chamados sacerdotes do Senhor, ministros do nosso Deus” (Isaías 61.6a). Em Apocalipse, lemos a respeito de Israel:

“E nos constituiu reino e sacerdotes para servir a seu Deus e Pai. A ele sejam glória e poder para todo o sempre! Amém. Tu os constituíste reino e sacerdotes para o nosso Deus, e eles reinarão sobre a terra. Felizes e santos os que participam da primeira ressurreição! A segunda morte não tem poder sobre eles; serão sacerdotes de Deus e de Cristo e reinarão com ele durante mil anos.” (1.6; 5.10; 20.6)

5. 1Pedro 2.10

“Antes vocês nem sequer eram povo, mas agora são povo de Deus; não haviam recebido misericórdia, mas agora a receberam” (1Pedro 2.10).

Neste contexto, isso parece ser uma clara alusão à declaração do profeta Oseias de que “eu a plantarei para mim mesmo na terra; tratarei com amor aquela que chamei Não amada. Direi àquele chamado Não meu povo: Você é meu povo; e ele dirá: ‘Tu és o meu Deus’” (Oseias 2.23; cf. 1.9; 2.1).

Segundo Romanos 9.24-26, nós – como gentios – também fomos acrescentados a esse novo povo, mas Pedro fala à parte judia da igreja.

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6. 1Pedro 2.25

“Pois vocês eram como ovelhas desgarradas, mas agora se converteram ao Pastor e Bispo de suas almas” (1Pedro 2.25).

Essa declaração também se refere primariamente aos judeus. Paulo, o apóstolo dos gentios, não adota tal formulação em suas cartas, mas ela corresponde àquilo que Jesus sentiu a respeito de seu povo:

“Jesus ia passando por todas as cidades e povoados, ensinando nas sinagogas, pregando as boas-novas do Reino e curando todas as enfermidades e doenças. Ao ver as multidões, teve compaixão delas, porque estavam aflitas e desamparadas, como ovelhas sem pastor.” (Mateus 9.35-36)

O Senhor Jesus declara: “Tenho outras ovelhas que não são deste aprisco. É necessário que eu as conduza também. Elas ouvirão a minha voz, e haverá um só rebanho e um só pastor” (João 10.16).

A mim parece que a expressão “Tenho outras ovelhas que não são deste aprisco” se refere a judeus na diáspora – eram os judeus que viviam fora do aprisco da terra de Israel. Pedro então escreve para esses israelitas convertidos na dispersão (1Pedro 1.1). Com isso acrescentaram-se judeus de fora do aprisco – bem como Jesus anunciara. Nos eventos de Apocalipse acrescenta-se então plenamente o remanescente judeu.

O início ocorreu no Pentecostes. Esse grande dia comemorativo atraía a Jerusalém judeus do exterior (Atos 2.5-12,37-41). Eles ouviram a mensagem, converteram-se, foram adicionados ao rebanho e depois retornaram aos seus países como ovelhas salvas. A esses judeus Pedro diz: “Pois a promessa é para vocês, para os seus filhos e para todos os que estão longe, para todos quantos o Senhor, o nosso Deus, chamar” (Atos 2.39).

Não deveríamos transferir as declarações bíblicas imediatamente para a nossa situação presente. Antes, precisamos entender o que esse texto significava originalmente.

Que Pedro aplicou essa declaração a judeus e não a gentios fica claro pelo fato de, mais tarde, ele ter ficado muito surpreso quando Cornélio, um gentio, também foi salvo e acrescentado (Atos 10).

7. 1Pedro 4.3

“No passado vocês já gastaram tempo suficiente fazendo o que agrada aos pagãos. Naquele tempo vocês viviam em libertinagem, na sensualidade, nas bebedeiras, orgias e farras, e na idolatria repugnante” (1Pedro 4.3).

Pedro escreve que eles viviam como judeus segundo os costumes dos pagãos: haviam-se assimilado. Paulo, por sua vez, escreve como apóstolo dos gentios aos efésios: “Portanto, lembrem-se de que anteriormente vocês eram gentios por nascimento e chamados incircuncisão pelos que se chamam circuncisão, feita no corpo por mãos humanas...” (Efésios 2.11).

Os judeus a quem Pedro escreve não eram gentios, mas viviam segundo os costumes dos gentios. Os gentios a quem Paulo escreve eram gentios de origem, segundo a carne, e coerentemente viviam como gentios.

Então, depois de constatarmos, de forma tão detalhada, que a carta de Pedro foi destinada a cristãos judeus, caberia perguntar se essa carta também vale para nós, que somos cristãos gentios. É claro que ela é dirigida pelo Espírito Santo a todos os filhos de Deus e pode ser considerada como carta à igreja, mas sempre levando em conta que ela foi originalmente escrita a cristãos judeus – fato que não deve ser ignorado.

Anotei algumas perguntas-lembretes que serão úteis para uma compreensão mais clara da Escritura Sagrada:

  • A qual situação foi dirigida determinada palavra?

  • A quem se dirige a palavra?

  • Ela valia só para aquele tempo?

  • Ela teria um significado de validade geral, válida também para nós, hoje?

  • Trata-se de eventos já ocorridos ou ainda por ocorrer?

Essa lista deve ser aplicável nos limites menores das circunstâncias mais imediatas e também nos limites mais amplos dos outros contextos. A. E. Knoch traz uma ilustração: uma declaração comparável a uma plantinha não pode ser grosseiramente arrancada do solo em que está enraizada para então ser contemplada em “estado ressequido”. A plantinha precisa ser observada plantada no solo, ou seja, é preciso ver o relacionamento que ela tem com o local em que se encontra.

Não deveríamos transferir as declarações bíblicas imediatamente para a nossa situação presente. Antes, precisamos entender o que esse texto significava originalmente. Somente em um segundo passo é que ele pode ser interpretado também para as nossas circunstâncias atuais.

O dr. Arnold G. Fruchtenbaum escreve a respeito da “regra de ouro da interpretação”, formulada pelo teólogo David L. Cooper:

Se o sentido simples de uma passagem das Escrituras estiver claro para o bom senso humano, então não procure outro sentido. Procure, portanto, entender cada palavra em seu sentido original, simples, comum e real, a menos que o contexto imediato – examinado à luz de enunciados bíblicos semelhantes e sem verdades inegáveis e fundamentais – aponte claramente em outra direção.[1]

Nota

  1. Arnold G. Fruchtenbaum, Handbuch der biblischen Prophetie (Asslar, Alemanha: Gerth Medien GmbH, 1993), p. 11.
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Norbert Lieth nasceu em 1955 na Alemanha, sendo missionário na América do Sul entre 1978 e 1985. Casado, tem 4 filhas. Hoje faz parte da liderança da Chamada da Meia-Noite em sua sede, na Suíça. O ponto central de seu ministério é a palavra profética, sendo autor de diversos livros e conferencista internacional. Ele estará presente no 25º Congresso Internacional Sobre a Palavra Profética, organizado pela Chamada.

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