Pessoas que Encontrei na Viagem: Parte 1 – Zuínglio
Ana Paula e eu retornamos de uma viagem à Europa com a Chamada há alguns dias. Visitamos locais referentes à Reforma Protestante e a fatos da Segunda Guerra na Suíça, Áustria e Alemanha. Você pode descrever uma viagem de muitas formas. Você pode falar das horas viajadas, seja por avião, carro ou outro meio. Você pode falar dos lugares visitados e das paisagens vistas, ou pode mesmo falar dos aspectos históricos de cada lugar. Cada um desses relatos tem seu valor. Quero, no entanto, pedir licença para descrever essa viagem por meio das personalidades que conheci, ou passei a conhecer mais. Caso você tenha interesse em conhecer pessoas interessantes, acompanhe esta série de artigos.
O primeiro personagem sobre o qual pude conhecer mais na cidade de Zurique, na Suíça, foi Ulrico Zuínglio, ou Ulrich Zwingli. Qualquer um que tenha estudado sobre a Reforma Protestante conhece ao menos o nome deste reformador. Nascido em uma família de posses, ele foi educado em universidades e logo se mostrou um pregador destacado. Após seus estudos, assumiu o posto de pastor na catedral de Zurique. Zuínglio começou a pregar sobre suas ideias, defendendo o que ficou mais tarde conhecido como as cinco “Solas” (somente a Escritura, somente a fé, somente Cristo, somente a graça e somente a Deus toda a glória). Rapidamente, essas posições fizeram com que fosse acusado como herege pela Igreja Católica. No entanto, seu trabalho como expositor bíblico, pastor e mesmo como reformador em Zurique já havia rendido apoio e aclamação.
Muitos cristãos têm silenciado, mesmo quando percebem que o ensino bíblico tem perdido seu caráter central.
Mesmo sendo contemporâneo de Lutero, e ainda que as ideias de ambos fossem muito próximas, eles nunca chegaram a concordar quanto à doutrina da ceia. Lutero insistia na presença real de Cristo nos elementos e Zuínglio defendia apenas uma presença espiritual, fazendo com que os elementos fossem apenas símbolos. Seu ministério fez com que se envolvesse em reformas educacionais – da igreja e do próprio sistema de educação –, além de políticas. Esse aspecto o levou a envolver-se nas guerras religiosas na Suíça entre os cantões protestantes e os cantões católicos. Na batalha de Kappel am Albis, em 1531, ele foi morto e, afirma a tradição, seu corpo foi esquartejado e queimado.
De que forma a vida de Zuínglio pode nos orientar e inspirar? Eu percebo ao menos três pontos que me inspiram e que creio que devem orientar a todos nós.
Primeiro, seu apego à Palavra de Deus. Em uma época em que a autoridade e o ensino da igreja eram mais importantes do que os ensinos da Bíblia, este homem buscou intensamente conhecer a Palavra (Salmos 119.11). A partir dessa busca, ele passou a ensinar a verdade conforme a Palavra e, em última análise, esta ênfase lhe custou a vida. Em nossos dias, vemos movimentos dentro e fora da igreja onde opiniões se tornam tão ou mais prestigiadas que a Palavra. Muitos cristãos não se sentem confortáveis com isso – mas quem quer ser acusado de ser retrógrado, antiquado ou ultrapassado? Com isso, muitos cristãos têm silenciado, mesmo quando percebem que o ensino bíblico tem perdido seu caráter central.
Os conceitos de justiça, verdade, valorização da vida e honestidade devem afetar tanto minha relação com Deus como todos os aspectos da vida humana.
Segundo, a fé afetando todos os aspectos da vida. Para Zuínglio, seguir a Jesus afetava diretamente seu pensamento político, educacional e social (Colossenses 3.23-24). Vivemos em uma época de tensões políticas e ideológicas. Conheço cristãos que separam suas convicções cristãs de suas convicções políticas. Com isso, apoiam ideias e mesmo partidos que se colocam diretamente contra a fé cristã e o ensino bíblico. Acredito que o que cremos com relação a Deus não se resume a ideias “religiosas”, mas abrange a vida toda. Os conceitos de justiça, verdade, valorização da vida e honestidade devem afetar tanto minha relação com Deus como todos os aspectos da vida humana. Não há áreas onde a verdade de Deus não possa entrar e orientar.
Terceiro, força de suas convicções. Zuínglio acreditava tanto no que ensinava que viveu suas convicções até as últimas consequências. Pessoalmente, como homem dos nossos dias, tenho dificuldade de compreender uma guerra entre cristãos protestantes e católicos. Na minha percepção, havia muitos outros interesses políticos e econômicos em jogo, que alimentaram e levaram esses cristãos a se enfrentarem em combate. No entanto, o que quero destacar é que, de forma consistente com sua crença de que a fé afeta todos os aspectos da vida, Zuínglio entendeu que não poderia se esquivar de acompanhar seus compatriotas nessas guerras. Uma vez mais, penso em mim e em você. Até que ponto estou disposto a defender minhas ideias? Tenho muitas vezes me sentido tentado a evitar confrontações e conflitos? Por um lado, isso faz sentido, pois somos chamados à paz, por outro, podemos perder oportunidades de apresentar a razão da esperança que há em nós (1Pedro 3.15)
Minha sincera oração é que homens como Zuínglio, ainda que pecadores e limitados ao seu tempo, nos inspirem a amar a Palavra, aplicá-la em todos os aspectos da vida e a viver nossas convicções.